Por Jucemar Paes Neto (bolsista de extensão PROBOLSAS)
Daniel Christian Henrique
Atualização em 13/01/2021 às 20:32
O mês de outubro de 2020 iniciou uma retomada de vendas no setor automotivo não esperada anteriormente frente a pandemia em curso, marcando como o melhor mês de vendas até aquele momento para o ano. Houve um aumento de 7,4% na produção de veículos e aumento das exportações em 14,3%. O presidente da Fenabrave, Alarico Assumpção Júnior, indica que essa melhora ocorrida neste mês diz respeito a maior confiança do consumidor e do aumento da oferta de crédito concedido no período da pandemia. Em novembro o clima positivo manteve-se, com a produção praticamente no mesmo ritmo e com aumento ainda mais expressivo das exportações, atingindo elevação de 26,2% em relação a outubro. Todavia, no comparativo do acumulado no ano, janeiro a outubro acumulou uma redução de 30,9% em comparação ao mesmo período de 2019 (ANFAVEA, 2020; SMABC, 2020). O ano de 2020 no seu todo concretizou uma perda de 31,6% apesar da recuperação que ainda adveio sobre o mês de dezembro, que culminou na saída definitiva das fábricas da Ford do Brasil. Os fortes subsídios que o governo federal vinha já vinha ofertando ao setor desde a pré-crise não foi suficiente para segurar o impacto da redução das vendas na empresa (GAZETA DO POVO, 2021).
Todo esse cenário não converge para uma previsão prospectada pela Anfavea em uma pesquisa realizada em maio de 2020 através do aplicativo Webmotors sobre Intenção de Compra no Cenário COVID-19. Um dos principais resultados aponta que 89% dos respondentes tinham intenção de comprar ou trocar de carro em 2020, contrapondo o cenário do final de 2019 em que 66% mantinham a mesma intenção. Dentre os 11% que não pretendiam adquirir um novo carro em 2020, 57% alegam a incerteza financeira advinda de uma situação de desemprego que os impedem de efetuar a compra hoje (ANFAVEA, 2020b). Tomada a situação regional de Santa Catarina no período pré-pandemia, registrou-se um crescimento de 17,47% nos emplacamentos de veículos em comparação a novembro do mesmo período, somado a um acréscimo da venda de motos em 14,52%. O Diretor regional da Fenabrave-SC, Julio Schoeder, alicerçava essa expansão a maior confiança do consumidor alinhada a quedas dos juros, na inadimplência e no desemprego (ENGEPLUS, 2020).
Portanto, pode-se notar uma relação intrínseca entre as variáveis independentes “oferta de crédito” e “emprego” para análise adequada de quais delas podem mais impactar na variável dependente “vendas de veículos”. Uma previsão de crescimento desta variáveis no longo prazo, principalmente no que se concerne ao emprego, vem a ser tão mais eficaz para alavancar as vendas das montadoras (assim como as vendas demais indústrias nacionais) do que a habitual medida pontual de oferta de subsídios que apenas reduzem parcialmente a estratosférica carga tributária do setor automotivo, que ultrapassa os 50% do valor de um veículo e não estimulam a inovação ou geração de mais emprego.
Essa relação foi averiguada, então, para o estado de Santa Catarina com um comparativo com o estado de São Paulo, visto ser o estado com a economia mais vigorosa do país. Pelo fato dos meses de fevereiro a setembro de 2020 teriam sido marcados por um período anormal de vendas de veículos advindo da pandemia, com os ânimos e ansiedades se arrefecendo próximos a outubro (mesmo com o crescimento dos casos de coronavírus decorrentes da segunda onda) e as demandas por veículos iniciarem sua retomada de vendas em outubro (confirmando ainda as pesquisas da Anfavea), optou-se por realizar as análises com dados mensais de janeiro de 2004 a dezembro de 2019 a fim dos fortes impactos do período pandêmico não gerarem distorções nas análises. As variáveis foram coletadas no Banco Central do Brasil (BACEN, 2020), intituladas conforme visto a seguir:
Os resultados são os apresentados em sequência de forma sintética em tabelas para um melhor comparativo analítico. Foram desenvolvidos Vetores Autorregressivos (VAR) com aplicação da Causalidade de Granger para averiguação da existência da relação defasada mensal entre as variáveis, seguido pela aplicação da Função Impulso-Resposta para observar o sentido de aumento ou decréscimo da variável dependente ao elevarem-se em um desvio padrão os valores dos resíduos das variáveis independentes.
Para ambos estados a melhor relação defasada entre as variáveis nos testes AIC, HQ e FPE foram 10 lags, sendo todas tratadas em segunda diferença. A análise da Causalidade de Granger mostrou que existe um relacionamento defasado de dependência entre todas as variáveis tanto para o estado de São Paulo quanto para Santa Catarina, visto que todos os p-values foram significativos (inferiores a 5%) como pode ser observado nas tabelas 1 e 2. Também foi observado o impacto que o impulso de um desvio padrão no resíduo de cada variável ocasiona nas respostas das outras tomadas como dependentes através da Função Impulso Resposta (FIR). Neste quesito, observou-se a tendência mais comum do aumento ou diminuição da variável no computo dos 10 meses futuros de previsão ofertados pelo ferramental.
Tabela 1: Causalidade de Granger e FIR - Santa Catarina | ||||
Causalidade de Granger | Função Impulso Resposta | |||
Y | X | Resultado | Estatística | Resultado em Y |
Vendas | Vendas | - | - | ↑ |
Crédito | Aprovado | 4,30E-07 | ↑ | |
Emprego | Aprovado | 1.117e-07 | ↑ | |
Crédito | Vendas | Aprovado | 1,06E-02 | ↑↓ |
Crédito | - | - | ↑ | |
Emprego | Aprovado | 4.22e-10 | ↑ | |
Emprego | Vendas | Aprovado | 3.475e-08 | ↓↑ |
Crédito | Aprovado | 0.001459 | ↑ | |
Emprego | - | - | ↑ |
Causalidade de Granger e FIR – São Paulo | ||||
Causalidade de Granger | Função Impulso Resposta | |||
Y | X | Resultado | Estatística | Resultado em Y |
Vendas | Vendas | - | - | ↑ |
Crédito | Aprovado | 4,45E-03 | ↑ | |
Emprego | Aprovado | 5,67E-05 | ↑ | |
Crédito | Vendas | Aprovado | 4,10E-02 | ↑ |
Crédito | - | - | ↑ | |
Emprego | Aprovado | 3,73E-05 | ↑ | |
Emprego | Vendas | Aprovado | 3,32E-08 | ↓ |
Crédito | Aprovado | 1,01E-02 | ↑ | |
Emprego | - | - | ↑ |
Os dados comparativos entre Santa Catarina e São Paulo apontam igualdade no sentido do impacto ocasionado pelo aumento do crédito e do emprego geram dez meses à frente, elevando as vendas de veículos. Obviamente, tomado um cenário de desemprego, uma redução do emprego orientada por um choque negativo na própria variável incorrerá em redução na venda de veículos. O mesmo raciocínio é válido para um choque negativo na oferta de crédito a pessoa física. Observou-se ainda na autocorrelação das vendas sobre ela mesma, que o aumento das vendas estimula no futuro novas vendas. De forma complementar, dentre os demais achados, nota-se que o aumento da oferta de crédito à pessoa física traduz-se em aumento do emprego, que por sua vez irá gerar aumento no crédito. Esse é um efeito recíproco que faz toda a economia girar e se desenvolver, apenas devendo-se tomar cuidados para que a ofertar excessiva de crédito por longos períodos não incorra em elevações descontroladas da inflação. Portanto, o aceno para subsídios são pontuais e de curtíssimo prazo, mostrando ser um remédio que com o tempo perde seu efeito. O foco dos governos estaduais e federais deve focar-se no estímulo à competitividade e inovação de suas fábricas como um todo para constante geração de empregos, em especial as montadoras que sempre foram tão características e representativas em várias sociedades, incluindo a brasileira.
Futuramente, ao término da pandemia, pretende-se complementar este estudo fazendo-se um comparativo destes resultados com uma análise equivalente para o período pandêmico, iniciando-se em fevereiro de 2020 até o seu futuro término oficial como o objetivo fim de constatar os impactos na venda de veículos frente as ofertas de auxílio emergencial, quebra de recordes do número de desempregados - com início da elevação das admissões em novembro de 2020, vindo a ser este o melhor resultado da série histórica do CAGED, registrando criação de 414,5 mil cargos com carteira assinada (PDET, 2020) - e concretização ou não das expectativas dos consumidores em adquirir um novo carro em 2020 durante a pandemia observadas pela Anfavea. Essa última relação é muito importante ser efetivada pois o inverso pode ter acontecido neste período, no qual apesar da ascensão do desemprego, o temor de usar o transporte público pela maior probabilidade de contaminação pelo vírus pode ter estimulado a médio prazo a compra ou troca de carro. Claro, cabe destacar previamente que muitas das vagas criadas e readmissões criadas a partir de novembro são em decorrência das readmissões das massivas demissões do período pandêmico. Desta forma, todas estas ponderações merecem um estudo em particular posterior para um efetivo comparativo futuro ao período pré-pandemia aqui analisado.
Referências
ANFAVEA. Estatísticas. Disponível em: http://www.anfavea.com.br/estatisticas. Acesso em: 22 dez. 2020a.
ANFAVEA. Intenção de Compra no Cenário Covid-19. Disponível em: http://www.anfavea.com.br/docs/webmotors_impacto_covid.pdf. Acesso em: 22 dez. 2020b.
BACEN. Banco Central do Brasil. Disponível em: https://www.bcb.gov.br. Acesso em: 10 dez. 2020.
ENGEPLUS. Santa Catarina registra crescimento de 17,47% nos emplacamentos de veículos automotores. Disponível em: http://www.engeplus.com.br/noticia/geral/2020/santa-catarina-registra-crescimento-de-17-47-nos-emplacamentos-de-veiculos-automotores. Acesso em: 22 dez. 2020.
GAZETA DO POVO. 4 pontos para entender porque a Ford decidiu fechar suas fábricas no Brasil. Disponível em: https://www.gazetadopovo.com.br/economia/ford-motivos-por-que-fechou-fabricas-brasil/. Acesso em: 13 jan. 2021.
PDET. Programa de Disseminação das Estatísticas do Trabalho. Ministério do Trabalho. Disponível em: http://pdet.mte.gov.br/. Acesso em 24 dez. 2020.
SMABC. Sindicato dos Metalúrgicos do ABC. Outubro é o melhor mês de vendas em 2020 e Onix lidera. Disponível em: https://smabc.org.br/outubro-e-o-melhor-mes-de-vendas-em-2020-e-onix-lidera/. Acesso em: 22 dez. 2020.